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Mário Magalhães lança em BH sua biografia de 2018, 'Sobre lutas e lágrimas' c5v1e

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Foi sob o olhar retrospectivo a 2018 que o jornalista e escritor Mário Magalhães escreveu a “história de um país castigado por dores e inflamado por paixões” em Sobre lutas e lágrimas – Uma biografia de 2018 (Record).
 
A eleição de 2018 como biográfico faz reverência a 1968: O ano que não terminou, de Zuenir Ventura. E é para falar sobre esses dois anos que não terminaram que Mário Magalhães participa nesta segunda-feira (16) do Sempre um Papo, em Belo Horizonte. Mário Magalhães está em turnê pelo país para apresentar o livro, lançado há dois meses e já na terceira reimpressão. De Belo Horizonte ele seguirá para Belém.
 
“Meio século mais tarde, 2018 está longe de sedimentar suas tramas e seus traumas, o que impede exame retrospectivo isento de incertezas relevantes. Mas se sabe que suas consequências influenciarão decisivamente o país por tempo prolongado. Por isso, tão cedo não vai terminar. Daqui a 50 anos, o 2018 brasileiro talvez tenha o peso histórico que hoje conferimos a 1968”, escreve o autor.
 
Diferentemente da obra de Zuenir Ventura, que foi escrita 20 anos depois dos acontecimentos de 1968, o livro de Mário Magalhães, nas palavras do próprio autor, ganhou forma “no olho do torvelinho”, à quente, quando os fatos ainda se desdobravam.
E é nesse 2018 que o medo da ideológica narrativa da “ideologia de gênero” e o “kit gay” inflamam a histeria da classe média; macacos são perseguidos e assassinados como se transmitissem a febre amarela; as vacinas são repudiadas; o feminicídio ganha mais argumentos; índios e jovens se suicidam e a intervenção militar no Rio de Janeiro anuncia o sonho de um governo impopular de concorrer à reeleição. Tanques e extermínios de jovens pretos de periferia ganham holofotes. São 43 capítulos, que contam, mês a mês, e por vezes, semana a semana, o desencadear cronológico dos fatos que constroem a biografia do ano que, como 1968, não terminou.

Ao relatar a história dos vencidos, contraposição à narrativa oficial dos vencedores, a escrita de Mário Magalhães combina gêneros múltiplos: reportagem, ensaio, artigo e crônica. E, para além da força dos fatos, busca na indignação o fôlego para a resistência ao obscurantismo. “É um livro indignado, em um tempo que exige indignação”, escreveu.
 
A inspiração para o livro – que tem por protagonistas Marielle Franco, executada em 14 de março; Luiz Inácio Lula da Silva, preso em 7 de abril em processo de lawfare; e Jair Bolsonaro, eleito em 28 de outubro – nasceu a partir das colunas semanais de Mário Magalhães para o site The Intercept Brasil, conforme o próprio explica na introdução. Algumas delas foram reelaboradas e inseridas na biografia de 2018 em capítulos cronológicos.
 
Dos 43 capítulos, oito são inéditos, entre eles Sintomas da doença, que relata a caçada a macacos. Com o título de O ano que tão cedo não vai terminar, no prólogo Mário Magalhães articula toda a trama do ano biográfico.
E, assim como Zuenir Ventura em 1968: O ano que não terminou inicia a obra com o Réveillon da Helô (Heloísa Buarque de Hollanda); Mário Magalhães está na virada para 2018 com Marielle e sua esposa, Mônica. Começa assim, a biografia de um ano pesado, com o alento de uma história de amor. Leia a seguir a entrevista de Mário Magalhães ao Estado de Minas.
 
O sr. é o autor da biografia de Marighella, considerado um dos símbolos da resistência contra a ditadura militar no Brasil, que foi a referência histórica para o longa-metragem Marighella, dirigido por Wagner Moura. O lançamento era esperado para 20 de novembro e foi cancelado. O que está acontecendo" height="200"> 
 
Inclusive no capítulo A censura de volta do ano biográfico de 2018 fiz o inventário do recrudescimento da censura na imprensa, nas artes, mas, principalmente a partir de 2017, quando o Santander Cultural interrompeu em Porto Alegre a mostra Queermuseu, nas artes, na imprensa, ou seja, a censura voltando a se alastrar pela sociedade. E agora, em 2019, o Itamaraty censurou, via embaixada no Uruguai, o filme sobre Chico Buarque.
 
A Câmara Municipal de Porto Alegre censurou a exposição de charges O riso é risco: Independência em risco. Teve a censura na Bienal do Livro do Rio. E lá, ainda, tivemos também censura em três curtas em exibição. Além disso,  assistimos à perseguição às universidades e à ciência, com corte de bolsas. E isso terá igual impacto na vida do Brasil como teve durante a ditadura, quando os cientistas perseguidos da Fundação Oswaldo Cruz, em Manguinhos, foram embora do país.
Então é isso. Os acontecimentos decisivos de 2018 vão influenciar a vida brasileira por décadas.

Se 1968 e 2018 são anos que ainda não terminaram, qual será o legado dos dois anos biográficos para o regime de governo no Brasil nos próximos 50 anos">
Inclusive, mesmo depois de seu auge, na eleição de 1955, em que se elegeu Juscelino Kubitschek, o ex-integralista Plínio Salgado obteve 8% dos votos naquela eleição presidencial. No Paraná, ele teve um entre quatro votos.
 
Nesse confronto entre civilização e barbárie, é indispensável assegurar a pluralidade: a civilização não pressupõe pensamento único. Os ideais civilizatórios, iluministas e democráticas supõem a livre manifestação de ideias. Assim como é direito humano o o à informação, que lhe permite formar juízo por conta própria. A ascensão da extrema direita é muito estimulada pela crise econômica, que vai fragilizando a democracia. De qualquer maneira, sou ruim de prognósticos. Sou um contador de histórias. A isso me proponho.
 
Mas acho que, para se defender hoje a civilização contra a barbárie, é indispensável conhecer a história. E jamais naturalizar a barbárie, como dizer que o feminicídio é mimimi, defender a tortura, defender a execução, referir-se ao peso do ser humano em arrouba, defender o desaparecimento das minorias. Essas ideias estão no poder. E na defesa da civilização é preciso confrontar o poder. Quem calar vai consentir. 
 
 
Sobre Lutas e Lágrimas – Uma biografia de 2018
Mário Magalhães
Record (330 págs.)
R$ 49,90
O jornalista e escritor participa hoje do projeto Sempre Um Papo, às 19h30, na Sala Juvenal Dias do Palácio das Artes (Avenida Afonso Pena, 1.537, Centro). Entrada franca.
 
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