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Arte e tecnologia

Artistas brasileiros questionam a IA que "ressuscitou" os Beatles

Compositores descartam criar com ajuda da inteligência artificial e reclamam do fato de a nova ferramenta não pagar direitos autorais

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Vencedora do Grammy 2025 como “Melhor Performance de Rock”, a canção “Now and then”, escrita por John Lennon em 1977, teve a gravação original danificada, mas foi restaurada com ajuda da Inteligência Artificial. Graças à IA, recuperou-se o áudio do registro original e se aprimoraram trechos da guitarra de George Harrison. A tecnologia Machine Audio Learning (MAL) permitiu a remoção de ruídos da antiga fita de Lennon.


Com guitarras de Harrison gravadas em 1995, baixo, piano, guitarra e vocais de Paul McCartney, bateria e vocais de Ringo Starr, os Beatles, cuja carreira se encerrou em 1970, “ressuscitaram” no Grammy. Mas a utilização da Inteligência Artificial causa polêmica entre artistas brasileiros.

O compositor Guilherme Arantes, dono de vários hits, diz que a IA não funciona para ele. “O fundamento do meu interesse pela música é minha integral participação no fazer. Para mim, o produto é irrelevante, se comparado com o produzir. Fazer a música, a letra, é tudo para mim. Então, a IA é um embuste, porque faz um 'by' naquilo com que mais sonho: emitir a ideia. Não tenho interesse no que os algoritmos de automação possam propor para substituir a minha criatividade. Isso seria uma negação de talento.”

Guilherme Arantes: Prazer de fazer


Arantes afirma que já lhe bastam os ritmos e sons dos recursos modernos da eletrônica. “Prefiro sempre compor tocando piano e procurando as soluções dentro de mim. O prazer de fazer é o maior território de garantia da arte. Sem o prazer de dizer legitimamente 'esta ideia saiu de mim', qualquer produto fica 100% fora de comparação. Então, a a ser uma bobagem”, comenta.


“Já tenho dificuldade em ter parceiros, que, aliás, são poucos. Como é que meu ego reagiria com a máquina me sugerindo caminhos musicais ou até de letras?”, observa.

Flávio Venturini: IA para 'separar' instrumentos


Outro “campeão de hits” da música brasileira, o mineiro Flávio Venturini diz que nunca comporá com ajuda de inteligência artificial.

“Baixei um ou outro aplicativo para saber um pouco mais do assunto. Uso um aplicativo de IA que pega a música e separa os instrumentos. Fiz isso para algumas canções em meus shows. Por exemplo, pegar o vocal de uma e colocar para dobrar e enriquecer o show. Já na parte rítmica, uma percussão, algo assim. Posso dizer que isso foi é a única coisa de IA que me foi útil na prática.”

Flavio Venturini sorri para a câmera
Flavio Venturini descarta a possibilidade de compor em parceria com a inteligência artificial Anchell Fotografia/divulgação


Autor de “Linda juventude” (com Márcio Borges), “Espanhola” (com Guarabyra) e “Todo azul do mar” (com Ronaldo Bastos), Venturini afirma que não precisa de IA para compor. “Não vejo isso com bons olhos, porque compor é uma coisa mais detalhada e a inspiração faz parte do momento da composição. O que a pessoa está vivendo, sentindo, a emoção ajuda muito.”

Samuel Rosa: IA usurpa o trabalho do autor


Samuel Rosa não usa inteligência artificial, mas acredita que tudo deve ser visto com parcimônia. “Na música, a IA é mero facilitador. Não tenho grandes expectativas de ver uma coisa maravilhosa, até porque ela meramente repete, não cria. Ela faz uma coisa com insumos que não são provenientes dela – neste caso, eles vêm dos músicos.”

Samuel Rosa olha para a câmera
Samuel Rosa defende a regulamentação da inteligência artificial, que usa a criação de compositores mas não paga direitos autorais a eles Lorena Diniz/divulgação


É necessário regulamentar a inteligência a artificial para depois empregá-la na música, defende. “Na falta da regulamentação, as pessoas começam a usurpar, a tirar sem autorização aquilo que é do outro. Esse é meu medo. Então, na hora em que o cara fala em criar um álbum dos Beatles como se eles estivessem vivos e atuantes, o que usar para fazer o disco? Os próprios Beatles. Na hora em que a IA faz música, está usando informações, ela não cria nada. E essas informações são de terceiros.”

Artistas protestam contra leilão de obras com IA realizado pela Christie's


Qualquer produto que chega ao mercado paga pela matéria-prima. A inteligência artificial se baseia na criação alheia, o que remete a direitos autorais. “O cara que fizer uma banda tipo Skank, onde ele pegará informação? No próprio Skank. Então, isso tem de ser cobrado, tem o direito de quem fornece esse tipo de insumo.”


Porém, Samuel pondera: “A IA já está entre nós”. O ponto crucial, afirma, “é a regulamentação dos insumos que a IA vai usar para produzir, porque ela vai tirar de nós, músicos, o que já gravamos.”

Kiko Zambianki: "Tiro no pé"

Kiko Zambianki acha ridículo premiar canções da IA. “Para esse tipo de música, deveria ser obrigatória a identificação de fácil o para todos, além de algum dispositivo que denunciasse o uso de IA. Não deveria existir prêmio que compare composições feitas por humanos e por IA, pois ela se utiliza do talento dos artistas para funcionar, é cópia descarada em alguns casos. Isso só serve para a diminuição de nossa capacidade e o aumento da preguiça mental, que já é grande.”


Para o músico, IA “é tiro no pé”, pois limita e restringe habilidades artísticas naturais. “Algumas inteligências artificiais estão melhorando a cada dia, mas ainda são repetitivas nos arranjos e de uso limitado. Artistas vêm sendo imitados por essas IAs sem pagamento de direitos. Apesar de interessante, acho que o talento humano corre o risco de começar a perder seu valor.”

Antônio Júlio: ferramenta como o protools

Vocalista da banda belo-horizontina Tianastácia, Antônio Júlio fez dois testes com IA.

“No primeiro, falei o tema que queria para a letra e dei referências de alguns artistas, porém o resultado não me agradou. No segundo, peguei uma letra minha e do Beto Nastácia, dei liberdade para a IA criar a música e a melodia. Até achei engraçado, mas Beto achou horrível. Porém, vejo que a ferramenta pode mudar coisa, como aconteceu como o protools (software para produção musical) e a guitarra elétrica lá nos primórdios”, conclui.

Affonsinho: lado bom e lado ruim

Affonsinho confessa que não tem dado atenção à IA. “Quero continuar fazendo a música que gosto e seguir tentando aproveitar a vida. Essas coisas são poderosas e dominam mesmo. Elas têm um lado bom e outro ruim, porque o ser humano é assim, né? Acabei de lançar um single com a participação de Fernanda Takai, chamado 'O que tem pra saber?', no qual a letra fala sobre essa coisa do homem de querer conhecer a Lua, Marte, Disney, Europa... Mas não conhece nem um pedacinho do coração da pessoa que está dormindo a seu lado e o coração dos filhos”, diz.

“Penso parecido sobre essa coisa de IA. O ser humano devia procurar se conhecer mais por dentro e melhorar o planeta de verdade, mas o autoconhecimento deve ser 'assustador'. Mais fácil é ir a Marte e inventar máquinas", afirma.


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