LUTO NA MÚSICA

O adeus a Cristina Buarque, a enciclopédia do samba

Considerada uma guardiã do gênero, cantora, que morreu ontem, deixa como legado uma discografia que recolocou compositores em cena por meio de sua voz

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"Uma cantora avessa aos holofotes. Como explicar um negócio desses em qualquer tempo? Mas como explicar isso nesse tempo específico? Uma vida inteira de amor pelo ofício e pela boa sombra". Com essas palavras, Zeca Ferreira, um dos cinco filhos de Cristina Buarque, comunicou, pelas redes sociais, a morte da mãe, aos 74 anos, na manhã deste domingo (20/4), por complicações decorrentes de um câncer de mama. Irmã de Chico Buarque, ela se notabilizou por trazer à luz compositores de samba muitas vezes esquecidos.


Filha do sociólogo Sérgio Buarque de Holanda, autor do clássico "Raízes do Brasil", e da pianista Maria Amélia Alvim Buarque de Holanda, Cristina Buarque se consolidou, ao longo da carreira, como uma referência para diversas outras cantoras, como Marisa Monte e Mônica Salmaso. A primeira, por exemplo, conheceu a música "Esta melodia", de Bubu da Portela e Jamelão, que regravou em seu álbum "Verde, anil, amarelo, cor-de-rosa e carvão" (1994), por meio de Cristina, que a registrou no disco "Prato e faca" (1976).


"O samba perde hoje sua maior guardiã", escreveu em suas redes sociais a cantora e compositora Joyce Moreno. A frase traduz com precisão a relação que Cristina estabeleceu com o gênero musical, pautada pelo zelo e pela devoção evidentes nos álbuns que gravou ao longo de sua trajetória. Ela começou a carreira na música nos anos 1960. Em 1974, gravou seu primeiro álbum, "Cristina", que conta com o sucesso "Quantas lágrimas", de Manaceia.


Convidada de Vanzolini


Na ocasião do lançamento, ela disse, em entrevista ao jornal "Folha de S.Paulo": "Quando digo meu nome, as pessoas ficam numa expectativa que não tem sentido. Ficam esperando ver um trabalho semelhante ao de Chico, quando na verdade fazemos coisas completamente diferentes. Ele compõe, eu canto. É só". Cristina entrou em cena sete anos antes de seu debute fonográfico, em 1967, se apresentando somente como Cristina, na condição de convidada de Paulo Vanzolini (1924-2013) no álbum "Onze sambas e uma capoeira".


No disco, ela interpretou o samba "Chorava no meio da rua", de autoria do compositor paulista. Na sequência, Cristina dividiu com Chico Buarque a interpretação do samba-canção "Sem fantasia", registrado em seu terceiro álbum, lançado em 1968. Daí em diante, a cantora trilhou o próprio caminho sem precisar se aproveitar do prestígio e da fama do irmão. E a trilha seguida por Cristina foi o samba dos bambas da velha guarda. Isso ficou claro logo em seu álbum de estreia.


Nele estão presentes canções de Cartola (1908-1980), Noel Rosa (1910- 1937), Ismael Silva (1905-1978) e Dona Ivone Lara (1922-2018), além de Manacéia (1921-1995), entre outros baluartes do samba. A partir de 1995, ano em que gravou com Henrique Cazes um disco com músicas de Noel Rosa, Cristina incorporou o famoso sobrenome Buarque à identidade artística, ciente de que, àquela altura, já era sabido por todo mundo que ela nunca se beneficiou do parentesco com Chico.


Durante toda a trajetória profissional, a cantora sempre fez questão de perpetuar a obra de grandes sambistas. Avessa aos holofotes, como destacou o filho em sua postagem de despedida, Cristina era chamada de "Chefia" e considerada uma enciclopédia do gênero musical. De origem paulistana e criação carioca, ela viveu os últimos anos em Paquetá, no Rio de Janeiro, onde comandava afamada e concorrida roda de samba.

Intérprete de timbre delicado e preciso, ela se manteve, durante toda a carreira, fiel à missão de revelar compositores do gênero que considerava estarem ainda à sombra ou afastados do público. A coerência da discografia referencial de Cristina Buarque ficou atestada em álbuns como "Arrebém" (1978), "Vejo amanhecer" (1980), "Cristina" (1981) e "Resgate" (1994). A obra da cantora inclui também álbuns em tributos aos compositores Wilson Baptista (1913-1968) e Candeia (1935-1978). 

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