O PAPA LEÃO XIV NA VISÃO DE DOM WALMOR
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Desde 2004, Dom Walmor Oliveira de Azevedo é arcebispo de Belo Horizonte. Nascido em Cocos, na Bahia, em 1954, Dom Walmor foi ordenado padre em 1977, em Juiz de Fora, e bispo em 1998. Foi bispo auxiliar de Salvador de 1998 a 2004 e presidente da Confederação Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) de 2019 a 2023. Em entrevista EXCLUSIVA ao D&J Minas Dom Walmor, uma das mais respeitadas lideranças da Igreja Católica brasileira, fala do conclave que elegeu o novo Papa Leão XIV e de suas expectativas frente ao novo pontificado.
Qual a opinião de Vossa Eminência sobre o resultado do conclave? O fato de o cardeal Robert Francis Prevost não ter figurado entre os favoritos pode lhe trazer alguma dificuldade inicial?
A cada conclave, muito se especula sobre “favoritos” e, ao final, quase sempre, a comunidade internacional se surpreende. Após discernimento, diálogo e, principalmente, abertura à amorosa ação do Espírito Santo, é eleito aquele que reúne, pelo menos, 2/3 dos votos do colégio cardinalício. Então, desde o conclave, o pontificado já começa como forte expressão da unidade da Igreja. Isto não significa que há uniformidade de pensamento, de visões de mundo. A unidade permite a convivência entre perspectivas diferentes que, a partir do diálogo, da abertura ao Espírito Santo, tornam-se riqueza na vida da Igreja. A missão de um pontífice é exigente e complexa, ainda mais neste mundo interconectado, mas o Papa Leão XIV, com a graça de Deus, terá um frutuoso pontificado, pois reúne as virtudes necessárias para bem exercer a sua missão.
A escolha no nome de Leão XIV significa que o cardeal Prevost coaduna e se aproxima das ideias de Leão XIII?
Nosso Papa explicou que muitas foram as suas inspirações para a escolha do nome, mas fez especial referência à Carta Encíclica Rerum Novarum, importante documento da Igreja publicado no fim do século 19 que, àquela época, profeticamente alertava sobre as condições precárias dos trabalhadores, consolidadas com a Revolução Industrial. A Carta Encíclica foi escrita pelo Papa Leão XIII, dando origem à Doutrina Social da Igreja. O Cardeal Prevost, ao adotar o nome Leão XIV, expressa que o seu olhar se volta para a condição precária de muitos trabalhadores no mundo contemporâneo, especialmente daqueles que são excluídos em um contexto marcado pela expansão das tecnologias digitais e da inteligência artificial. A Igreja, na sua missão de agir coerentemente com os princípios do Evangelho, não pode se calar diante da exclusão, da desconsideração do direito de todos à vida plena. O Papa Leão XIV guiará a Igreja na sua missão de ser voz profética também neste contexto de acentuados avanços tecnológicos.
O que Vossa Eminência enxerga de semelhança e/ou diferença entre o pontificado do agostiniano Papa Leão XIV e do jesuíta Papa Francisco?
Cada pontífice, em seu ministério, contribui para a Igreja avançar em sua história bimilenar, na missão de ajudar o mundo a enfrentar seus desafios. O Papa Leão XIV inicia o seu caminho na sucessão do apóstolo Pedro dando sinais de que levará adiante as iniciativas nascidas sob o pontificado de Francisco. Naturalmente, outras frentes de trabalho e novas semeaduras serão inauguradas no atual pontificado. O Papa Leão XIV tem sólida formação humanística e intelectual, uma experiencia pastoral singular, exercida em realidades diversas. Seu pontificado é dom para a Igreja e para a humanidade.
A Igreja Católica tem perdido seguidores ano a ano. Vossa Eminência acha que o Papa Leão XIV que, por ter 69 anos apenas, deve ter um longo pontificado, terá condições de reverter esse quadro e atrair, principalmente, os jovens para a Igreja? Por quê?
O número de católicos no mundo registrou crescimento nos últimos anos, segundo dados do Anuário Pontifício 2025. São um bilhão e 406 milhões de católicos em todo o planeta. Mas, de fato, existe uma profunda mudança de paradigma na relação do ser humano com a religião. A Igreja não entra em disputa por fiéis, nem se preocupa simplesmente com números. A Igreja volta o seu olhar para aqueles que hoje perderam a alegria que só pode ser experimentada a partir da fé. Homens, mulheres e, especialmente, jovens que atravessam um profundo vazio existencial, com graves adoecimentos, porque não encontram sentido na própria existência. No mundo contemporâneo, as pessoas trilham caminhos equivocados na busca por duradoura alegria – investem no consumo exagerado, no ilimitado anseio por satisfação efêmera -, desconsiderando a força que vem da fé. São perdidos, assim, os vínculos comunitários, enquanto se acentua um individualismo que se desdobra na indiferença em relação ao semelhante. Essa realidade desafiadora interpela, certamente, o Papa Leão XIV e toda a Igreja. Cada discípulo de Jesus tem a missão de testemunhar a alegria de crer. É a partir desse testemunho que inspiramos novas conversões.
Por ter a maior população de católicos do mundo, com 183 milhões ou 13% dos católicos mundiais, o que o Brasil pode esperar do novo Papa?
O Papa Leão XIV é cosmopolita e o seu olhar de pastor volta-se para cada país, para cada cultura, pois todos necessitam do anúncio do Evangelho, da presença da Igreja, sempre e cada vez mais acolhedora, “Igreja em saída”, que vai às periferias geográficas e existenciais. Antes de ser Pontífice, Leão XIV esteve no Brasil. Exerceu seu ministério na América Latina por muitos anos. Viria participar da Assembleia Geral da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), que foi adiada com o falecimento do Papa Francisco. A sua proximidade com os brasileiros, construída antes mesmo de seu ministério como sucessor do apóstolo Pedro, certamente se tornará ainda mais forte. Também nós, brasileiros, somos convocados a rezar pelo Papa Leão XIV, fortalecendo o seu ministério na missão de guiar a Igreja neste tempo do terceiro milênio.