O PRAZER PELO DIREITO AOS 81 ANOS
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O Sr. se formou em direito, em 1970, pela UFMG, e em filosofia, em 1984. É mestre e doutor e professor de direito e processo do trabalho. O que o levou a dedicar toda uma vida ao Direito do Trabalho? Tem relação com sua formação filosófica e religiosa?
Para melhor responder, é indispensável dizer que, após ter feito o curso ginasial em Pedro Leopoldo, decidi ingressar no Seminário da Arquidiocese de BH, em 1966, onde fiz o curso médio e três anos de filosofia e dois de teologia. Ao deixar aquele ambiente religioso, revelo um segredo: vislumbrei a hipótese de fazer direito ou psicologia, ambas ciências humanas, e perguntei a um colega de sala italiano, que se formara em direito, as características do curso. Optei por direito por me possibilitar enxergar a pessoa humana em sua existência consigo mesmo e na sociedade. Acredito que fui abençoado na opção, pois pelo direito posso trabalhar para que a pessoa humana, que não é uma ilha, se encontre consigo mesmo, com os outros e com o meio ambiente a que está integrado. Como diria o poeta, tornei-me alguém de uma nota só, ainda que com vários acordes. Tenho muito a agradecer, por muito ter recebido no caminhar.
O Sr. foi ministro do TST de 1998 a 2014, tendo sido presidente da Alta Corte trabalhista de março de 2013 até se aposentar. Quais os principais legados deixados no período da presidência? A Justiça do Trabalho de hoje é diferente de 10 anos atrás?
Em um ofício, sobretudo público, o importante é cumprir as tarefas ordinárias da melhor forma possível. Essa é a divisa que procurei vivenciar, no julgar e istrar, ciente das limitações pessoais.
Compartilhando com os colegas, destaco a criação do Berçário Min. Cnéa Cimini, primeira ministra do TST, em 18 de fevereiro de 1994, para acolher os filhos de servidores durante o expediente de trabalho.
Realce para o empenho na estruturação do Processo Judicial Eletrônico na JT, cujo início de implantação deu-se em dezembro de 2011. Momento de evolução com a utilização da tecnologia para aprimorar a prestação jurisdicional, em que os movimentos processuais, realizados fisicamente, tornaram-se virtuais. Em 2013, intensificamos os contatos com os advogados por meio do Conselho Federal da OAB e da ABRAT, que enriqueceram as análises com os olhares ímpares dos causídicos. O caminho foi o do diálogo.
A preocupação com a modernização dos recursos, na busca de solução mais rápida e eficaz, levou-nos a participar ativamente dos debates parlamentares sobre alterações na CLT, sobretudo acerca do Processamento de Recursos na JT. Dos debates sobre o Projeto da Câmara 63/2013, em que atuou como nosso representante o ministro Vieira de Mello Filho, resultou a Lei 13.015/2014, com o aprimoramento do atual sistema recursal em que o TST se tornou o uniformizador da jurisprudência trabalhista.
Acerca da regulamentação da Emenda Constitucional 72, que ampliou os direitos dos empregados domésticos, resultou a Lei Complementar 450/2015, em que a voz competente do TST foi a do ministro Maurício Godinho Delgado.
A Justiça do Trabalho hoje tem outra fisionomia, com planejamento global voltado à segurança e saúde do trabalhador, com política contra a discriminação e proteção à infância, voltada aos interesses coletivos e em continuada busca de decisão em prazo razoável.
Após concluir uma das mais exitosas carreiras da magistratura trabalhista mineira, o Sr. abraçou a advocacia em Brasília/DF, onde atua diariamente. Com 81 anos, o direito está no sangue? Além dele o que contribui para tamanha vitalidade?
Retornar à advocacia, observado o triênio constitucional, foi uma necessidade de vida. Afastei-me com 70 anos e me sentia em ótimas condições físicas e mentais. Sempre achei que a velhice chega quando se deixa dominar pela inércia. Tornei-me um profissional do direito e, como um sapateiro, não devo ir além das sandálias. Fazer o que se gosta é sempre um prazer. O direito me gratifica, até pelos desafios. É a vida de que me alimentei por anos e anos, e continuo a me alimentar.
Também, em feliz coincidência, em 2019, minha neta Amanda formou-se em direito na FUMEC, em BH, mudou-se para Brasília, partilha comigo a advocacia e é mestranda da UDF.
Confesso, ademais, que faço caminhadas e frequento com regularidade a academia.
Além da família e do direito, o Sr. tem duas paixões: Pedro Leopoldo, sua cidade natal e o América Mineiro, seu time do coração, de quem é uma espécie de embaixador maior. De onde vem essa paixão? Qual a maior alegria teve com o tradicional time do Horto?
Ainda bem que você disse família, que está à frente de tudo. Mas Pedro Leopoldo é a terra em que nasci, fui batizado e frequentei igreja, andei a pé e de bicicleta, estudei no primário e ginasial. Para onde voltei em 1967 para lecionar no Ginásio Estadual. Vi a cidade crescer e se desenvolver. Lá tenho casa. É onde tenho amigos de infância, da adolescência e da fase adulta, ainda que poucos, os quais carrego comigo sempre.
O América Mineiro é um caso à parte. Ser americano é um legado de meu pai, sempre cultivado. Somos poucos, portanto diferentes. Temos muita crença e fé. Não acreditar em milagres, mas sim no valor do pouco. Tudo com muita intensidade, pois somos formadores de craques. É a fé que anima Afonso Celso Raso, Bernardo Vaz, Marcus Salum, entre outros. Integro há anos o nosso Conselho Deliberativo e atualmente o Conselho de Ética e Disciplina.
Assim foi quando disputamos a Libertadores pela única vez em 2022 e nos classificamos para a fase de grupo em jogos emocionantes em que ganhamos nos pênaltis com defesas do Jailson.
Já como decacampeão, ao longo do tempo apenas fomos campeões mais seis vezes, e como valeu o título obtido em 2016 em cima do Atlético. Foi demais e inesquecível!