Cerca de duas semanas depois do asfaltamento da Rua Jogo da Bola, em Diamantina, na Região do Vale do Jequitinhonha, o Conselho Internacional de Monumentos e Sítios (Icomos), organização não governamental global associada à Unesco, emitiu um alerta à prefeitura da cidade sobre os riscos que Diamantina corre com a pavimentação de ruas do centro histórico.

O conselho é responsável por promover a conservação, a proteção, o uso e a valorização de monumentos, centros urbanos e sítios.

No documento do Icomos, a organização cita o título de Patrimônio Histórico concedido em 1999 e solicita a imediata reversão da pavimentação das vias no centro histórico da cidade, de forma a “resguardar os valores e compromissos assumidos quanto à proteção do conjunto”.

O centro histórico de Diamantina recebeu dois tombamentos. O primeiro foi feito em 1938 pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). Em dezembro de 1999, a cidade foi reconhecida como Patrimônio Mundial pela Unesco.

O jornalista Américo Antunes, que foi coordenador da campanha que levou a cidade a conquistar o título de Patrimônio da Humanidade, explicou que entre os compromissos que a cidade firmou na época que o título foi concedido estava preservar as características originais da cidade.

A rua Jogo da Bola foi pavimentada às vésperas da Semana Santa e sem consulta prévia à população, o que dividiu opiniões entre moradores, especialistas e o poder público. Em vídeo publicado nas redes sociais, o prefeito Geferson Burgarelli (Paquito), que também é vice-presidente da Associação das Cidades Históricas de Minas Gerais, agradeceu aos trabalhadores envolvidos na obra, ressaltou que tudo foi feito em conformidade com os órgãos responsáveis e afirmou que a rua está fora da área oficialmente tombada. Ele também prometeu a revitalização de outras vias da cidade, como a Rua Rio Grande e outras do centro histórico.

Porém, segundo Américo, o tombamento do Iphan de 1938 inclui o grupo escolar Júlia Kubitschek, que está localizado no trecho da rua Jogo da Bola que foi asfaltado. “Temos o conjunto urbano tombado pelo Iphan em 1938 e, dentro desse conjunto, temos a área que foi oferecida para o reconhecimento da Unesco como Patrimônio Mundial com cerca de 480 edificações, incluindo também a parte viária das ruas e os traçados originais da cidade desde a época da fundação”, explicou o jornalista.

Para Américo, o alerta do Icomos pode fazer a prefeitura repensar na pavimentação de outras ruas do centro histórico da cidade. “O risco de perda do título mundial ameaça o projeto de desenvolvimento econômico e social da cidade e da região, que tem um de seus pilares mais importantes no turismo histórico, cultural e natural”.

Na época em que a pavimentação foi feita, a prefeitura, por meio da Secretaria Municipal de Cultura e Patrimônio (SM), afirmou que a intervenção foi precedida de análise e autorização do Iphan, com base no Parecer Técnico nº 028/2025/ETD-MG/IPHAN-MG, relativo ao Processo nº 01514.000396/2025-24. Segundo o documento, a substituição do calçamento por asfalto foi permitida exclusivamente no trecho entre a esquina da Rua Juca Neves e a Avenida da Saudade, por estar fora da poligonal do tombamento federal.

Porém, o alerta do Icomos cita o mesmo parecer técnico do Iphan, afirma que o documento desautoriza a ação efetuada e que a pavimentação realizada incide em área delimitada pela Unesco como zona central de proteção. A organização ainda enfatiza que a pavimentação coloca em risco e ameaça valores considerados para o reconhecimento do título de Patrimônio Histórico.

A reportagem do Estado de Minas entrou em contato com a prefeitura de Diamantina e com o Iphan sobre o assunto e aguarda retorno.

O asfalto

O asfaltamento ainda divide opiniões dos moradores. Vídeos que circulam nas redes sociais mostram uma enxurrada da rua Jogo da Bola, recém-pavimentada, durante a chuva que atingiu a cidade na tarde dessa segunda-feira (28/4). “Olha que a chuva não foi nem volumosa como pode vir a ser”.

“Foi apenas uma questão de tempo para provar que estávamos certos sobre o absurdo que foi esse asfalto”, disse uma pessoa.

Na semana em que a rua foi asfaltada, a ex-secretária de Cultura Márcia Bethânia, que classificou a pavimentação como um “choque dolorido”, alertou para o risco de alagamentos, já que a cidade carece de infraestrutura adequada de drenagem, agravada pela impermeabilização do solo.

Porém, pessoas que defendem o asfaltamento de vias de Diamantina apontam que a mesma situação acontece em ruas próximas à rua Jogo da Bola e que seguem com o calçamento de pedras. “Sempre deu muita água nesse local. Posso afirmar que a culpa com certeza não é do asfalto”.

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“Que venha mais asfalto! Falar da quantidade de pessoas que torcem os pés nesse calçamento de pedras, ninguém fala, né?”, expôs outro morador.

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