Uma doença estigmatizada e incapacitante
Pesquisa aponta que 51% dos pacientes escondem que têm enxaqueca
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Siga noDor de cabeça intensa, náusea, vômitos e sensibilidade à luz e sons. Os sintomas da enxaqueca são sentidos há pelo menos 3 mil anos. Há relatos em escrituras egípcias – datadas de 1200 a.C. – que já mostravam algumas semelhanças com essa doença. Neste mês de conscientização para a enxaqueca, artigo científico veiculado no The Journal of Headache and Pain, a publicação oficial da Federação Europeia de Dor de Cabeça, chama a atenção. No período entre o surgimento dos primeiros sintomas até a procura por um especialista, os pacientes demoram, em média, 17,1 anos para buscar um tratamento adequado – seja por desconhecimento, medo ou vergonha. Resultado: as pessoas optam pela automedicação – analgésicos, na grande maioria –, o que aumenta a intensidade das crises, até que procurem um médico.
Além da questão de saúde, o paciente enxaquecoso não tratado ou tratado inadequadamente é significativamente oneroso para as empresas, devido à perda de produtividade e absenteísmo, pelo fato de a enxaqueca ser considerada uma doença incapacitante, superando inclusive problemas cardiovasculares e algumas neoplasias.
Uma pesquisa apresentada no Simpósio Internacional Migraine Trust (MTIS) sobre o comportamento dos pacientes em países da América do Sul, Ásia e Austrália apontou que 51% deles escondem que têm a doença. Desses, 62% não comentam com os colegas de trabalho, 37% omitem de amigos e 27% não contam nem mesmo ao cônjuge. E olha que não estamos nos referindo aqui a males como o câncer, termo que não fazia parte da linguagem verbal de boa parte da população.
O impacto maior recai sobre os cofres dos governos e setores da saúde. Segundo o Instituto WifOR GmbH, na pesquisa "Impacto socioeconômico das principais doenças em oito países da América Latina", o Brasil é o segundo país mais afetado pela enxaqueca na América Latina, atrás apenas da Argentina. Em 2022, o Brasil perdeu 4,1% do Produto Interno Bruto (PIB), recurso utilizado no combate às principais doenças – patologias cardiovasculares, neoplasias, cardiopatia isquêmica, infecções respiratórias, câncer de mama, diabetes tipo 2 e enxaqueca. Cerca de US$ 30 bilhões ou R$ 168 bilhões foram perdidos com a enxaqueca.
Para chegar a esse montante, os pesquisadores levaram em conta os ganhos induzidos pela saúde em atividades de trabalho remunerado e não remunerado, considerando os anos perdidos devido à incapacidade ou mortalidade como não produtivos. Embora a enxaqueca, por si só, não seja fatal, ela é a doença mais comum entre pessoas de 5 a 19 anos, e a segunda mais comum, entre 20 e 59 anos, ou seja, praticamente durante toda a vida produtiva do trabalhador.
Infelizmente, a enfermidade não tem cura, mas há um tratamento preventivo, inclusive no Sistema Único de Saúde (SUS), nos casos de dores de cabeça frequentes e incapacitantes. O segredo está em não tomar analgésicos para cortar a dor, mas evitar a dor, dizem especialistas.
Não bastasse o extremo desconforto, o paciente enfrenta o estigma que cerca a doença, muitas vezes menosprezada e considerada de baixa repercussão. Falta compreensão da sociedade, daí a importância da campanha deste mês. Pelo menos 15% da população brasileira, cerca de 32,3 milhões de pessoas, sofrem com enxaqueca. No mundo, são mais de 1 bilhão de doentes.