
São Paulo (SP) – Foi numa excursão turística às cidades coloniais de Minas, aos 15 anos, que o paulista João Carlos aprendeu uma lição importante para nortear a vida pessoal, pavimentar os caminhos pelo mundo e, principalmente, conhecer os meandros profissionais.
Um dia após as simpáticas apresentações do grupo, o adolescente começou a perceber momentos de tensão, comentários deselegantes, enfim, picuinhas entre os viajantes do ônibus. E, assim, viu que conviver não é fácil, “pois cada pessoa tem hábitos e manias”.
Décadas se aram e, hoje, o maestro João Carlos Martins, de 79, se recorda da experiência para dizer que uma orquestra só funciona quando todos se respeitam. O episódio foi de tanta valia que ele decidiu incluí-lo no livro autobiográfico João de A a Z (Editora Sextante), no qual conta, por meio das 23 letras do alfabeto, a trajetória musical bem-sucedida, os períodos trágicos que levaram à perda do movimento das mãos e a superação proporcionada por seu amor à arte.
Na tarde da última terça-feira (10), em seu amplo apartamento na região dos Jardins, área nobre da capital paulista, João Carlos Martins abriu o livro da vida e as páginas do coração para falar de infância, juventude, maturidade e do trabalho à frente da Orquestra Bachiana Filarmônica Sesi-SP, fundada por ele em 2004, e do projeto social Orquestrando o Brasil.
De tanto amor pelo piano, que chegou aos seus dedos aos 7 anos de idade, o artista de reconhecimento internacional pediu ao arquiteto para projetar a sala do apartamento na forma de piano de cauda. E, assim, sob o teto pintado de preto, emoldurado por paredes brancas, instalou o instrumento e objetos que ajudam a contar parte de sua história. Numa mesinha de canto, como testemunha de tantos anos, fica o porta-retrato com a foto apenas das mãos do regente.
A de Amor, B de Bach, C de Concerto e por aí vai, até chegar ao Z de Zênite, que, conforme a astronomia, é o lugar mais alto da abóboda celeste, o cume de uma linha imaginária estabelecida por quem observa o céu. “O zênite é onde sinto que me situo – o ponto mais alto da minha trajetória.”
Para chegar à forma final da obra, e certo de que não havia uma “fórmula mágica” para fazê-lo nascer, o homem aplaudido nos grandes teatros do mundo começou a escrever de próprio punho. Se a mão doía, a determinação o levava adiante. “Foram 15 dias”, contabiliza a duração dos primeiros escritos.
Pensou em ditar o que ia à cabeça para que a mulher, Carmen, digitasse no computador: “Não deu certo, não tinha minha voz vindo lá do fundo.” Com a ajuda do editor da Sextante Pascoal Soto, que assina o prefácio, João Carlos Martins encontrou o caminho. E ao projeto se juntou o jornalista Vicente Vilardaga.
Soto registrou no prefácio: “João ou quase um ano a escrever esta obra tão especial. Ao longo daquele período, Vilardaga foi os dedos que o maestro já não podia utilizar para escrever nem tocar nem reger. E foi além, pois ajudou-nos a estruturar este dicionário da alma de um dos maiores artistas brasileiros de todos os tempos”. Para facilitar o trabalho do autor, acrescenta o editor, o jornalista fez as perguntas certas e precisas.
A sala ensolarada tem agora a presença de Carmen, que chega acompanhada da ajudante e traz uma bandeja com dois bolos, um recheado com coco, e uma cesta de pães de queijo. “Servir pão de queijo a mineiro, em São Paulo, pode ser demais, né">
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