
O jornalista, escritor e roteirista de 63 anos se diz curioso em saber como será a recepção de leitores formados nesse hiato marcado por tantas novidades, entre elas o surgimento das redes sociais. A expectativa, segundo Aquino, é que o público possa se reencontrar com as ruas por meio da leitura, algo que ele experimentou no processo de escrita, segundo conta.
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Marçal Aquino exibe narrativa tensa e impiedosa em 'Baixo esplendor'
O período longe da literatura foi ocupado pela produção de roteiros para filmes e séries de TV, como “O caçador”, “Supermax” e “Força-tarefa”, exibidas pela TV Globo. O surgimento da trama que possibilitou o reencontro com essa outra escrita foi espontâneo, diz o autor, mas potencializado pelo isolamento social imposto pela pandemia do novo coronavírus e a consequente saudade da vida nas ruas.
“Não tenho um processo criativo metódico. Não penso na história antes, com completude. Se eu souber muito sobre a história, é perigoso eu nem começar a escrever. Preciso da emoção da descoberta, como se eu estivesse me contando a história”, afirma.
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"O submundo é o meu cenário e, de uns anos para cá, gosto muito de histórias de amor. O amor é a única coisa subversiva, é a única coisa capaz de fazer alguém mudar de ideia. Então, procuro histórias capazes de examinar as relações entre homens e mulheres" 6i1r4m
Marçal Aquino, roteirista e escritor 6y2f2y
O escritor conta que “esbarrou em um trecho do meio do livro” ainda em 2018. O contato imaginário virou uma anotação sobre uma cena em que Miguel, que viria a ser o protagonista, leva um menino a uma casa de mulheres, no Centro de São Paulo. Algo desconexo do veio principal da história, mas que permitiu ao escritor iniciar o que se transformaria em “Baixo esplendor”.
“Depois disso, eu descobri que Miguel tem uma história com a irmã do chefe do bando em que ele se infiltrou e entendo que esse, sim, é um dos eixos. Tudo espontâneo, não mexo no tempo, e tudo vai se encaixando, inclusive o menino na casa de mulheres”, relata.
Aquino diz que o tempo “solitário e silencioso” em casa foi decisivo para o andamento da obra, concluída em agosto do ano ado, mais de um ano antes do prazo imaginado.
Diante dessas condições favoráveis à escrita, ele alimentou suas inspirações com a experiência dos anos atuando como repórter policial em São Paulo. O resultado é a história de Miguel, um agente da polícia que se infiltra em uma quadrilha de roubo de carga, no ano de 1973.
Em meio à tensão da operação, o protagonista se envolve em um amor tórrido com Nádia, a irmã do chefe do bando. Uma construção que ele prefere definir como “um drama criminal” em vez de um clássico romance policial, reforçando novamente a espontaneidade de criação.
“Costumo guardar, há muito tempo, notícias policiais, recortes dos mais inusitados e bizarros. Eu os utilizo nos roteiros que escrevo com o Fernando Bonassi para a TV. Neste ano, já com o livro pronto, coincidentemente, fui ver esses arquivos e encontrei uma notícia que falava sobre um policial que estava trabalhando infiltrado e se apaixonou por alguém do bando. É a gênese do meu livro, sem que eu tivesse me dado conta. Era algo que podia estar no meu subconsciente. Eu não sei o que estou escrevendo e, de repente, vejo que há amor numa novela policial”, comenta.

A relação amorosa dos personagens é descrita em “ Baixo esplendor” sem pudores em sua intimidade. Essa é uma característica de obras anteriores do autor, assim como a ambientação em um submundo urbano.
“Olhando para trás, alguns elementos são caros ao que eu escrevo e poderia soar como repetição. Porém, o que muitos críticos chamam de repetição é a reafirmação de um estilo. O submundo é o meu cenário e, de uns anos para cá, gosto muito de histórias de amor. O amor é a única coisa subversiva, é a única coisa capaz de fazer alguém mudar de ideia. Então procuro histórias capazes de examinar as relações entre homens e mulheres”, argumenta o autor.
Segundo ele, “é possível misturar o amor a um ambiente hostil”. Aquino cita como exemplo o seu livro “Eu receberia as piores notícias dos seus lindos lábios”, mas observa que, desta vez, “o amor aparece num tempo hostil, com o policial balançado, mas mergulhado no personagem que assume, a ponto de pensar em confrontar até o Exército. Uma história de amor tem essa função. A pergunta que paira na história é: até onde as pessoas estão dispostas a ir em nome do amor">