A verdade é que, mesmo já existindo há muitos anos, e não sendo exclusividade da UFMG, os casos de adoecimento na federal mineira aram a ser revelados somente nos últimos anos. E, ainda assim, são tratados com tabu, como reconhece a professora do Departamento de Psicologia da UFMG Stella Goulart. “Questões relativas a sofrimento mental nos estudantes são uma realidade internacional e temos trabalhado com esse tema na UFMG onde ele, até pouco tempo, não vinha à tona. Não temos estudos para dizer se piorou ou se já era assim. Mas, desde que casos aram a ser relatados, temos desenvolvido novas políticas de inclusão, encaminhamento para a rede pública de atenção psicossocial e acompanhamento dos alunos na universidade. As ações são voltadas para alunos da graduação e também para os estudantes da pós”, afirma Stella, que foi presidente da Comissão Institucional de Saúde Mental da UFMG.
A professora afirma que, depois que os casos começaram a vir a público, o clima ou a ser de alerta. “Estamos muito preocupados com a tensão dentro da universidade, com a saúde não só dos estudantes, mas também de professores e técnicos istrativos. As exigências no mundo acadêmico cresceram e temos que aprender a lidar com elas”, disse, citando as cobranças das agências de financiamento de pesquisa, além de outras questões, como a atual crise financeira que as federais enfrentam. “Estamos em um momento de sucateamento do ensino público gratuito, o que também produz muito mal-estar”, afirmou.
Tensão que os estudantes dizem enfrentar com dor e sofrimento. Uma dessas alunas, que concluiu o mestrado recentemente, conta sua experiência de frustração, que terminou com uso de antidepressivos e ansiolíticos. “Antes de entrar, eu tinha uma expectativa muito grande de que o mestrado seria um espaço de aprendizado e troca de conhecimento. E, na verdade, não foi isso o que aconteceu, porque havia uma distância muito grande entre orientador e aluno. Foram pouquíssimas orientações. O apoio, tão necessário, foi escasso. O mestrado foi um processo muito solitário, uma caminhada muito difícil, com mais baixos do que altos. O processo de escrita por si só já é angustiante, e quando a gente se depara com essa solidão, ele só piora. Em muitas ocasiões pensei em desistir”, conta ela, que desenvolveu um quadro de depressão e ansiedade.
A estudante, que prefere não se identificar, afirma ainda que ao mesmo tempo em que se sentia abandonada por sua orientadora, enfrentava outra pressão: “Os prazos eram curtos, as exigências, muitas, e os resultados, cobrados muitas vezes de forma grosseira, ríspida, sem flexibilidade. Eu só concluí porque busquei ajuda psicológica fora da universidade”, disse. Mas, para isso, a aluna disse ter pago um preço alto. “ei a fazer uso de antidepressivos regularmente, durante o último ano do curso, e continuo a usar. Quando terminei, foi uma sensação de conquista, mas com um misto de alívio e o sentimento de que estava livre. Não quis nem saber de tentar o doutorado, porque poderia ser até pior”, contou.
Segundo a aluna, ela e uma colega chegaram a procurar a coordenação do mestrado para fazer uma queixa formal sobre a orientadora que, posteriormente, as questionou sobre a reclamação, na frente de outros estudantes. “Sofremos retaliação da orientadora por causa disso. Ela nos causou constrangimento. O que nos pareceu é que a coordenação sabe do problema e não faz nada”, disse.

“Por causa do meu problema de saúde, eu precisava usar máscara e luva. Mas eu nunca tinha permissão, porque isso era tratado como chilique meu. Depois, meu trabalho não estava dando certo e ela resolveu mudar minha pesquisa por conta própria. No fim de um dos anos do doutorado, eu tirei férias, e quando voltei ela disse que não iria mais trabalhar comigo. Recolheu meu material e trancou tudo no laboratório dela. Tive que começar a trabalhar escondido. Quando chegou ao quarto ano, eu não tinha material suficiente para defender minha tese e comecei a discutir isso com ela. E ela sempre me rebaixava, gritava, gritava e gritava. Àquela altura eu já estava depressiva e tomava toneladas de remédio”, descreve.
A estudante conta que foram três anos de uso de medicação e que chegou, inclusive, a fazer uma reclamação formal à coordenação do doutorado, mas diz que a orientadora rebateu a queixa, desqualificando a estudante, que chegou a se afastar do curso. “Quando voltei, tinha ainda mais dados incertos em minha tese, que ela havia incluído. Naquela altura ela não conversava mais comigo, me mandava e-mails desaforados. A situação ficou insustentável e ao final, fui jubilada”, detalhou a aluna, referindo-se à expulsão por excesso de prazo de estudo.
Mesmo diante da oportunidade de fazer uma prova para retomar a pesquisa, a estudante diz ter chegado à conclusão de que não queria mais voltar. “Nem mesmo a reclamação formal que eu queria fazer à reitoria eu fiz, de tão cansada e esgotada que estava com todo o processo. Não quero nem ar perto daquela universidade. Foi um processo muito traumático.”