Festival de Teatro do Oprimido apresenta gratuitamente oito peças e um doc
Primeira edição do evento em Belo Horizonte começa neste sábado (4/4). Apresentações vão até 12/4, em diversos espaços da cidade
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Em 30 de dezembro de 2018, uma menina de 12 anos foi atingida no rosto por uma bala perdida na cidade chilena de Viña del Mar. Ela foi levada para o hospital, mas acabou não resistindo. Morreu no dia seguinte.
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O caso tocou de maneira especial o ator e dramaturgo Roberto Pino. Professor na escola onde a garota estudava, ele decidiu criar, junto com sua companhia de teatro Sinestesia, o espetáculo “Animita”.
A peça é uma performance de Teatro Jornal Estética Participativa – uma ramificação do método Teatro do Oprimido, desenvolvido por Augusto Boal na década de 1970 – que mescla realidade e ficção para discutir as consequências do tráfico de drogas no Chile.
Transitando entre rap e funk, “Animita” coloca em destaque o impacto da narcoviolência na população vulnerável do país. O público é imerso na realidade das periferias, conhecendo histórias marcantes desses territórios, além de interagir com os atores, ressignificando a performance e criando novas conclusões a cada apresentação.
“É uma peça que está sempre em construção, onde as pessoas podem elaborar o luto em conjunto”, explica Roberto. “No Chile, temos um problema grave em relação ao tráfico, e quem vive na periferia é mais afetado. Mas as autoridades fecham os olhos para isso”, acrescenta.
“Animita” é um dos destaques da primeira edição do Árvore – Festival de Teatro do Oprimido, que começa neste sábado (5/4) e segue até 12 de abril, com montagens em diversos espaços da capital mineira.
A programação se inicia com a peça “Suspeito”, encenada pelo Grupo de Teatro do Oprimido Cor do Brasil, do Rio de Janeiro, na Funarte. No formato de Teatro Fórum – outra vertente do Teatro do Oprimido, na qual a plateia discute com os atores e busca alternativas para os conflitos encenados – a peça destaca como o racismo institucional se camufla por meio de discursos de camaradagem e meritocracia no cotidiano.
Teatro Fórum
“Quando montamos um espetáculo de Teatro Fórum, a direção é completamente diferente da do teatro convencional. O Teatro Fórum é um processo em constante evolução. Não há como prever como será o diálogo com a plateia”, afirma Bárbara Santos, diretora de “Suspeito”.
O festival também traz montagens que abordam questões urgentes, como identidade de gênero (caso da peça “Generes”), o papel da mulher na sociedade (“Qual é o seu lugar?”), a resistência dos empregadores em relação a funcionários com transtornos mentais (“Doidinho para trabalhar”) e a pressão sobre os jovens, que pode levá-los à depressão e, no limite, ao suicídio (“Devagar escola”).
O Teatro do Oprimido completa 55 anos em 2025. Criado por Boal, esse método busca promover conscientização e transformação social, dando voz a grupos marginalizados e incentivando a participação ativa do público na busca por soluções para problemas reais. Nesse sentido, propõe encenações flexíveis, adaptáveis às realidades dos participantes.
“É um teatro conectado com as questões das pessoas”, resume Mari Sena, coordenadora do festival. “É um espaço para falarem de si, das situações que vivem, das opressões que enfrentam. Para expressarem aquilo que gostariam de mudar”, ressalta.
Como uma árvore, a metodologia de Boal ramificou-se ao longo dos anos, dando origem a diversas formas de encenação. Além do Teatro Jornal Estética Participativa e do Teatro Fórum, surgiram modalidades como o Teatro Imagem (baseado exclusivamente na expressão corporal, sem falas), Teatro Invisível (no qual o público não percebe que está assistindo a uma peça) e Teatro Assembleia (em que as soluções propostas pela plateia se transformam em projetos de lei).“É por isso que demos o nome de Árvore ao festival”, explica Mari Sena.
Reunião
Em Belo Horizonte, aproximadamente 10 grupos trabalham com o Teatro do Oprimido há pelo menos duas décadas. No entanto, até agora, nunca haviam se unido para desenvolver projetos em conjunto. O Árvore é a primeira iniciativa desse tipo.
“Algumas pessoas brincam que a meta do Teatro do Oprimido é se tornar desnecessário. Mas, infelizmente, as opressões se renovam. Além disso, há a questão de ser oprimido ou opressor. São papéis sociais que ocupamos no dia a dia. Em algumas situações, acabamos oprimindo; em outras, somos oprimidos. Por isso, é essencial manter o senso crítico e a consciência social para identificar esses papéis e agir para reverter qualquer postura opressora”, afirma Mari.
PROGRAMA-SE
Confira a programação do festival
5/4, sábado, 18h, Funarte (Rua Januária, 68, Centro) – “Suspeito”
6/4, domingo, 18h, Funarte – “Qual é o seu lugar?”
7/4, segunda-feira, 19h, Funarte – “Gêneres”
8/4, terça-feira, 13h30, Centro de Convivência São Paulo (Rua Aiuruoca, 501, Bairro São Paulo) – “Doidinho para trabalhar”
8/4, terça-feira, 19h, Funarte – Exibição do documentário “Pirei na Cenna: trajetória de uma luta”, do Grupo de Teatro do Oprimido Pirei na Cenna
10/4, quinta-feira, 14h, Centro Cultural São Geraldo (Rua Silva Alvarenga, 548, São Geraldo) – “Devagar Escola”
10/4, quinta-feira, 19h, Centro Cultural Venda Nova (Rua José Ferreira dos Santos, 184, Jardim dos Comerciários) – “Animita”
11/4, sexta-feira, 19h, Centro Cultural Vila Marçola (Rua Mangabeira da Serra, 320, Marçola) – “á-tempo: Encruzas, ancestralidades e identidades”
12/4, sábado, 16h, Parque Lagoa do Nado (Rua Min. Hermenegildo de Barros, 904, Itapoã) – “O pregador”
ÁRVORE – FESTIVAL DE TEATRO DO OPRIMIDO
Deste sábado (5/4) a 12 de abril, em diferentes espaços de Belo Horizonte. Entrada franca.