CINEMA

Sidarta Ribeiro critica o desprezo do mundo contemporâneo pelo sonho

Protagonista do filme "Criaturas da mente", neurocientista defende a parceria da ciência com saberes ancestrais nos estudos sobre o inconsciente coletivo

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“Sonhar com rei dá leão”. Imortalizada no samba-enredo da Beija-Flor de Nilópolis, campeã do carnaval carioca em 1976, a expressão exemplifica como a interpretação dos sonhos está presente na cultura popular brasileira.

A construção dos sonhos une experiências e símbolos coletivos, mostra o documentário “Criaturas da mente”. Dirigido por Marcelo Gomes, o filme é uma jornada pelo mundo do inconsciente conduzida pelo neurocientista e pesquisador Sidarta Ribeiro.

Em cartaz em BH, o longa aborda a relação entre as pesquisas das ciências biológicas sobre o inconsciente humano com os saberes dos povos originários e culturas afrodescendentes envolvendo o ato de sonhar.

“Criaturas da mente” apresenta o conceito de sonho comunitário, costume preservado por povos originários e comunidades tradicionais. As pessoas se reúnem para compartilhar o que sonharam e todos revelam suas próprias interpretações. Em entrevista ao Estado de Minas, o neurocientista Sidarta Ribeiro diz que todos nós devemos aprender com esta tradição, alertando que os sonhos têm sido maltratados no mundo contemporâneo.

“Para os povos originários, o sonho é um espaço onde você decide habitar. Acontecimentos de lá são vida real, como a vida da vigília. Isso é radicalmente oposto à atitude da nossa sociedade, que pede para que a gente desconsidere os sonhos, não os tome em consideração para a tomada de decisões e durma o mínimo possível, para poder voltar logo ao batente”, afirma Sidarta.

O documentário apresenta relatos das ialorixás Mãe Beth de Oxum e Mãe Lu e do líder indígena mineiro Ailton Krenak sobre o papel do inconsciente coletivo nas respectivas comunidades. Também discute o uso da ayahuasca e de outros alucinógenos como forma de experienciar o estado de transe para além dos sonos rotineiros.

Sidarta defende que compreender a participação dos sonhos na cultura e saberes dos povos tradicionais é tão importante quanto os estudos do inconsciente realizados pelas ciências tradicionais. Um conhecimento não deveria excluir o outro; eles deveriam se alinhar.

“Se os ianomâmis entendem que o céu tem um buraco e pode desabar, isso pode estar em alinhamento com a ideia do buraco da camada de ozônio. Se povos ayahuasqueiros da Amazônia Ocidental acreditam que todo o mundo e todos os seres têm dentro de si serpentes enroladas, isso pode estar em alinhamento com a noção de que todas as células têm DNA dentro delas, fitas parecidas com serpentes. As duas verdades têm sua legitimidade dentro de seu campo de atuação, digamos assim”, afirma o neurocientista.

O neurocientista Sidarta Ribeiro sorri para a câmera
Sidarta Ribeiro deseja que o filme 'Criaturas da mente' ajude as pessoas a se conscientizarem sobre seu mundo interior. Ele é um dos criadores do Instituto do Cérebro da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) Isabela Cunha/divulgação

Os sonhos apresentam caráter grupal, pois, mesmo construídos na mente do indivíduo, cada pessoa carrega o inconsciente coletivo, explica Sidarta. Sonhar envolve experiências e símbolos compartilhados. Sonhos de diferentes indivíduos apresentam situações em comum, especialmente entre pessoas que vivem no mesmo contexto.

Pandemia

O projeto “Criaturas da mente” foi iniciado durante a pandemia, no contexto histórico que afetou a vida de todas as pessoas e, por consequência, seus sonhos, observa o cientista.

“Por ser uma crise global, envolveu muito medo da morte, coletivizou a experiência e coletivizou os sonhos. Os sonhos ficaram com a temporalidade do mito, por se referirem ao ado e por dizerem respeito ao futuro. Não houve um dilúvio na história da humanidade, foram inúmeros em muitos lugares diferentes, gerando a grande memória coletiva do dilúvio. A pandemia se encaixa nisso. Um evento coletivo planetário com todo mundo, de alguma maneira, no mesmo barco. Alguns no andar de cima, a maioria no andar de baixo, mas todo mundo com medo da morte”, observa.

Sidarta espera que o filme de Marcelo Gomes ajude cada um a entrar em contato com o seu próprio mundo interior.

“Muita gente descobre, com bastante surpresa, que com um pouquinho de ajuste nas condições da entrada e saída do sono é possível revolucionar essa experiência. É possível recuperar a capacidade de se lembrar dos sonhos. Mas não é o que a sociedade pede, digamos assim. Tudo conspira para que você durma pouco e não se lembre de seus sonhos”, finaliza.

“CRIATURAS DA MENTE”

Brasil, 2024, 85min. Direção de Marcelo Gomes. Em cartaz às 17h30, na sala 3 do UNA Cine Belas Artes, que não abre às segundas-feiras.

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