"Assis Chateaubriand ligou os pontos no Brasil"
Protagonista do musical "Chatô e os Diários Associados - 100 anos de paixão", que chega a BH no próximo sábado (31/5), Stepan Nercessian fala sobre o personagem
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Celebrando, o centenário do conglomerado de comunicação que está entre os maiores do país, o musical “Chatô e os Diários Associados – 100 anos de paixão” estreia em BH no próximo sábado (31/5). O espetáculo estreou em 28 de março último, no Teatro João Caetano, no Rio de Janeiro, e fará temporadas também em Brasília e São Paulo.
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Com direção de Tadeu Aguiar, em uma ode aos primórdios da TV no Brasil, ao rádio e à liberdade de imprensa, a montagem é baseada na biografia de Assis Chateaubriand, fundador dos Diários Associados, o best-seller “Chatô, o Rei do Brasil” (1994), de Fernando Morais, que assina o roteiro do musical junto de Eduardo Bakr.
Jornalista, escritor, advogado, empresário e político, o paraibano Francisco de Assis Chateaubriand Bandeira de Melo (1892-1968) revolucionou a imprensa brasileira e introduziu a televisão no país. Stepan Nercessian é quem interpreta esse personagem. A vida de Chatô, o ponto de partida, entrelaça a trama que viaja a um só tempo pelo presente, ado e futuro do Brasil.
Em entrevista ao programa “EM Minas”, da TV Alterosa, Stepan Nercessian falou sobre a peça e seu personagem. Confira a seguir os principais trechos da conversa com a jornalista Carolina Saraiva, gravada no estúdio da Rádio Tupi, no Rio de Janeiro.
Como você se preparou para interpretar Assis Chateaubriand?
Fazer um trabalho novo é sempre um grande desafio. Fazer um personagem tão importante para a comunicação do país foi um desafio maior ainda. A gente não tem muita referência dele, da imagem, da voz, mas tem da história, da importância dele. Fui descobrindo as coisas durante os ensaios e, felizmente, as pessoas gostaram muito, disseram que o resultado está bom. Até quem conheceu Chatô disse que está bom.
Apesar das fotos e da história, não tinha áudio.
Depois de ver uma entrevista minha falando que não tinha conseguido ouvir a voz dele, que eu queria saber principalmente se tinha sotaque (era paraibano), um rapaz me mandou pelo Instagram alguns áudios. Fui fazendo e deixei que, pela história, pela sua emoção, constituísse a própria voz. E ficou bom, eu me sinto bem.
Quais são as peculiaridades que você traz de Chateaubriand para o espetáculo? Como era sua personalidade?
Era um homem absolutamente inteligente, perspicaz. Um raciocínio rapidíssimo, uma capacidade enorme de enxergar o futuro, de querer ir adiante. Ao mesmo tempo, sonhava muito alto. Não queria ter um um jornal, mas uma cadeia de jornais, não queria ter uma rádio, mas milhões de emissoras de TV. Por isso criou esses Diários Associados.
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Ligou os pontos no Brasil. Não queria estar só na cidade do Rio, mas em São Paulo e Pernambuco. Queria e fez. As emissoras associadas talvez tenham sido a primeira grande possibilidade de o Brasil se conhecer, falar entre si. E era um homem extremamente charmoso. Apesar de ser baixinho, as mulheres eram encantadas por ele. Teve grandes amores, grandes paixões.
É um espetáculo para encantar não somente profissionais de TV e rádio, mas todo o público?
Tivemos essa amostra numa temporada lindíssima no Rio de Janeiro. Ficamos muito gratificados com a reação do público. O teatro superlotado, 1 mil, 1,2 mil pessoas, todos os dias aplaudindo de pé o espetáculo, que não conta a história do Assis Chateaubriand, dos Diários Associados, sem contar a história do Brasil.
Ele não foi só um dono de jornal. Foi um homem que esteve sentado ao lado direito do poder. Partilhava da amizade com Getúlio Vargas, depois com Juscelino, com todos os presidentes. Foi muito influente, uma influência fora do comum. E isso tudo com paixão. Dizia, quando fez a rádio: "A Tupi vai investir o que for preciso para fazer brilhar o talento do artista nacional".
E ali na Rádio Tupi aram grandes artistas, como Carmem Miranda, Paulo Gracindo, Emilinha Borba, Severino Araújo, Orquestra Tabajara. Era um casting maravilhoso de artistas, não só de radionovelas, mas cantores, músicos, maestros. O espetáculo, até por ser um musical, trouxe para cena todo um repertório, toda uma lembrança musical que encanta as pessoas.
E muito bem interpretado com os nossos colegas – Cláudio Lins, Patrícia França, Sylvia Massari – e um elenco gigantesco de cantores e bailarinos de primeira linha. São mais de 15 pessoas cantando e dançando maravilhosamente.
O que o público de BH pode esperar desta montagem?
O mineiro é muito próximo da história. A história do Brasil a por Minas Gerais de uma maneira muito profunda. É um espetáculo que vai atrair a curiosidade das pessoas. O espectador pode ter certeza que vai sair do teatro com mais informações e sabendo mais coisas do que quando entrou. E vai se divertir muito. Vai ter um momento de felicidade.
Tem drama, romance, uma pitadinha de política e a comicidade que você trouxe...
Gosto de colocar isso do humor, porque, através do humor, você diz coisas que talvez tivesse mais dificuldade para dizer de uma maneira pesada, séria, e consegue ar essa mensagem.
E o Chateaubriand, por sua excentricidade, era um camarada que despertava muito riso nas pessoas também. Fazia coisas que não são do cotidiano. Sua maneira de falar, de tratar, de esculhambar, de brigar... Era um cara inquieto.
“Chatô e os Diários Associados – 100 anos de paixão” tem uma turma enorme no palco. Atores e cantores sensacionais. Como se reuniu esse elenco?
Está na hora de o Brasil reconhecer que nós temos um elenco de artistas de teatro musical que não deve nada a ninguém no mundo inteiro. É de nível internacional. Falo internacional porque a tradição do teatro musical é muito mais forte nos Estados Unidos. Aqui existiam os musicais antigos, e agora isso voltou com uma força muito grande.
O interessante no nosso espetáculo é que é originalmente brasileiro. Não estamos fazendo uma reprodução daqueles espetáculos que vêm de fora, prontos, chega aqui e só muda o idioma. Esse é criado especialmente.
É uma maneira muito bonita de contar essa história que o autor Eduardo Bakr e o diretor Tadeu Aguiar criaram. Começa com um jornalista que está no frevo, em Pernambuco, vê uma estátua de Assis Chateaubriand com a caneta na mão – ele só escrevia à mão.
Alguns vândalos roubam a caneta e esse jornalista fala: "Não façam isso, não roubem". Então a estátua do Assis Chateaubriand cria vida e fala para ele: "Venha, venha fazer uma viagem pelo tempo e contar a minha história".
Chateaubriand era um apaixonado. Conta que, quando garoto, era gago. Nem sabe como se curou da gagueira, mas a gagueira criou nele uma necessidade enorme de comunicação. "E quando o assunto é comunicação, eu quero ser o melhor, eu quero ser o maior, eu quero o novo, eu quero tudo", diz.
E foi por isso que ele dizia que todas as suas empresas, tudo o que fazia, todos seus investimentos eram para fazer jornal, mais e mais jornais. É um homem de atitudes inesperadas. De uma hora para outra, pegou todo esse império e criou um condomínio associado. Dividiu 49% das ações entre 22 funcionários de quem gostava e todo mundo virou dono. É uma coisa inusitada, rara, ninguém tinha feito isso até então.
É um camarada que fazia peripécias. Criou o Museu de Arte de São Paulo (Masp), considerado uma joia para a cultura e a arte no Brasil. Criou a escola de pilotos, conseguiu fazer com que a burguesia brasileira doasse 1 mil aeronaves para fazer a escola de pilotos.
Como ator, você põe umas pitadinhas suas ali, por exemplo, o futebol, não é verdade?
Quando o Chateaubriand fez a rádio, todo mundo criticou, dizendo que ia falir o jornal, porque estava tirando dinheiro do jornal para colocar na rádio. Mas ele tinha uma visão de que, em toda a comunicação, as formas se somam. Rádio, televisão, jornal... tinha que ser uma coisa só.
Por exemplo: ele fala que o jornal Estado de Minas era tão forte que, quando o Atlético Mineiro veio jogar no Rio de Janeiro em 1930 (não existia transmissão radiofônica naquela época), o povo foi todo para a porta do jornal para saber o que estava se ando no Rio no jogo com o Botafogo, meu time glorioso. Um repórter do Estado de Minas estava acompanhando o Atlético e, pelo telefone, ficava transmitindo para a Redação do Estado de Minas, em Belo Horizonte, o que estava se ando.
Outro repórter ia para a porta do jornal, onde estava uma multidão, e dava as informações. Aconteceu que o Botafogo fez 1 a 0, mas o Galo virou – fez 1 a 1, 2 a 1, 3 a 1. Quando fez 3 a 1, a torcida do Atlético começou a vibrar. Então o Botafogo virou e o jogo acabou 6 a 3. Conclusão: a torcida saiu tristezinha, mas foi uma demonstração da junção do rádio com o jornal. Informaram quase ao vivo o resultado, em tempo real.
Além de sua profícua carreira, hoje você também está à frente da Casa dos Artistas.
Estou há 22 anos na presidência da Casa dos Artistas. É uma casa de apoio, uma residência mesmo. São casas para onde as pessoas vão em um determinado momento da vida e am a morar. Não é um asilo, não é um retiro. Cada um tem sua casa, suas atividades. É mantido com doações. É difícil, mas vamos tendo várias respostas positivas. É um trabalho muito bonito. As pessoas amam o retiro, amam morar lá.
Você se considera um homem realizado?
Não diria assim. Deve ser assim quando você, em todos os setores, está se sentindo completo. Não sou assim ainda. Ainda tenho uma vida para levar. Por exemplo, sou um cara que não pode parar de trabalhar. Chega em um certo ponto da vida, se você tiver dinheiro, vai aproveitar bastante. Não tem essa história de "quero morrer trabalhando". Quero viajar, ear, comer do bom e do melhor, beber um bom vinho, namorar.
Sou realizado sob pouquíssimos aspectos, no sentido de que estou conseguindo levar a vida até aqui. Acho que ainda tenho muita coisa para fazer e sou fatalista – no final de tudo tem uma coisa chamada morte, que não deixa ninguém se sentir realizado.
Qual o convite que você faz para o público mineiro?
Estamos com uma expectativa muito grande. Conheço o público mineiro, já ei por aí com várias peças e realmente é um público especial. Aguardo vocês lá no teatro para ver “Chatô”.
“CHATÔ & OS DIÁRIOS ASSOCIADOS – 100 ANOS DE PAIXÃO”
Sessões em BH em 31/5 (sábado), às 15h e às 20h, e 1º/6 (domingo), às 18h. Grande Teatro do Sesc Palladium (Rua Rio de Janeiro, 1.046, Centro). Plateia 1: R$ 250 (inteira) e R$ 125 (meia). Plateia 2: R$ 180 (inteira) e R$ 90 (meia). Plateia 3: R$ 50 (inteira) e R$ 25 (meia). À venda no Sympla.