BR-381

BR-381: área que seria solução para famílias vira problema

Indefinição no uso de terreno adquirido pela PBH foi agravada por ocupação. Moradores venderam lote em que viviam e até comerciantes se estabeleceram no local

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Quando, em 2013, a Prefeitura de Belo Horizonte gastou R$ 4,9 milhões (R$ 12,4 milhões em valor corrigido) para comprar um terreno e reassentar moradores das margens da BR-381, a aquisição se apresentava como solução para centenas de famílias que viviam sob risco às margens da BR-381, no trecho conhecido como “Rodovia da Morte”.

O dinheiro foi obtido junto à Caixa Econômica Federal via Departamento Nacional de Infraestrutura e Transporte (Dnit), mas acabou não sendo usado, o que gerou agravamento da situação, porque o terreno foi ocupado irregularmente.

A reportagem do Estado de Minas esteve na região onde os lotes foram adquiridos, uma antiga propriedade da Rede Ferroviária Federal S.A. nas imediações dos bairros Belmonte, São Gabriel e Ouro Minas, na Região Norte de BH. O terreno, que já ficava espremido entre as construções estabelecidas na região, hoje está completamente habitado. Muitos dos ocupantes iniciais, inclusive, já venderam a área em que viviam e o local hoje dá lugar a construções de até três andares, com direito a comércio, academias e salões de beleza.

 O presidente da Associação de Desenvolvimento do Bairro São Gabriel e Adjacências, Gladstone Otoni dos Anjos, recorda que o terreno foi considerado uma conquista para os moradores das margens da 381, mas que nunca saiu do papel. “Essa área foi um achado dos movimentos sociais na época, entendendo que ia ser ressarcimento do que viria do Anel. Em dado momento, houve inversão da pauta quando a prefeitura começou liberando uma área para a comunidade cigana. A partir daí, teve ocupação desordenada. Não tem ninguém da remoção (da BR-381) aqui. Se tem alguém veio por conta própria”, conta.

Gladstone afirmou que o terreno foi cedido judicialmente à comunidade cigana da etnia Kalon (ou Calon), que habita a região desde os anos 1980. O adensamento subsequente é consequência direta do déficit habitacional.

Em 2020, a Câmara Municipal de Belo Horizonte calculou que a cidade tinha 78 mil famílias sem teto. Dados do Censo de 2022 mostram que o município tem mais de 108 mil domicílios permanentemente não ocupados, mais do que a quantidade de famílias necessitadas de uma residência e 20 vezes superior ao número calculado pela PBH para a população em situação de rua.

Por outro lado, Gladstone destaca que o terreno atraiu comerciantes também. “A ocupação desordenada foi enorme, por quem muito precisa e por quem nada precisa. Você pode ver que tem muito comércio em um terreno que deveria ser de moradia”, disse.

Moradores relataram dificuldades em contatar a prefeitura para serviços como capina de lotes, sinalização de ruas e policiamento. Além disso, questões inerentes a habitações não formalizadas, como o o a serviços de eletricidade e saneamento, afetam a região.

“O serviço é bem básico. Como temos postes que am aqui, 90% das luzes (das casas) têm ligação feita diretamente nele. A questão da água sempre foi uma questão de um morador direcionar para o outro mesmo, não tenha dúvida disso. Mas não tem a regularização de fato. A prefeitura abriu mão de ser a responsável por isso e acaba que as pessoas se organizaram”, apontou Gladstone.

Presidente da Associação de Desenvolvimento do Bairro  São Gabriel, Gladstone Otoni dos Anjos

Presidente da Associação de Desenvolvimento do Bairro São Gabriel, Gladstone Otoni dos Anjos

EDÉSIO FERREIRA/EM/D.A PRESS

Essa área foi um achado dos movimentos sociais na época, ia ser ressarcimento do que viria do Anel. Em dado momento, houve inversão da pauta

Gladstone Otoni dos Anjos, Presidente da Associação de Desenvolvimento do Bairro São Gabriel e Adjacências


O EM procurou a prefeitura para esclarecimentos acerca dos serviços ofertados ao terreno ocupado. Antes disso também acionou o Executivo repetidas vezes para obter informações sobre o endereço dos lotes adquiridos em 2013. Em todas as oportunidades a resposta tratou sobre as negociações ainda em andamento entre a PBH, o Tribunal de Contas da União (TCU), a Justiça Federal e o Dnit.

Em entrevista ao EM, o ex-prefeito Marcio Lacerda, que assinou a aquisição dos lotes, associou a não construção das moradias na área a entraves jurídicos, mas assegurou que, em sua gestão (2009-2016), não houve ocupação irregular.

“Logo após a do termo de compromisso, o Ministério Público Federal e a Defensoria Pública Federal se mobilizaram para impedir que fosse feita a transferência dos moradores para um projeto do Minha casa, minha vida. E isso entrou numa discussão de conciliação. Uma juíza de Belo Horizonte participou desse processo e a decisão final, em outubro de 2016, foi que os moradores teriam direito a uma verba para escolher a sua própria moradia onde fosse mais conveniente”, explicou.

Lacerda se referiu a uma mudança no modelo de reassentamento das famílias da BR-381 dentro do programa Concilia, projeto da Justiça Federal para remoção e reassentamento humanizado de famílias. A partir de 2017, parte das famílias foi retirada das margens da estrada e reassentada em outros locais em processo de compra assistida.

Nesse modelo, as famílias tiveram auxílio para escolher um imóvel compatível com a moradia anterior. A nova metodologia foi considerada eficiente pela Justiça Federal e resultou no reassentamento de mais de 260 famílias e a consequente extinção de vilas às margens da estrada.


CONCILIAÇÃO

Agora, a conciliação feita pelo TCU e mediada pelo TRF-6 busca solução. Uma decisão tradicional, sem a tentativa de conciliação, poderia envolver pagamento da PBH ao Dnit sem retirar as famílias da 381. Há ainda outro benefício associado a um acordo obtido via conciliação: a regulamentação da ocupação no São Gabriel.

“Os lotes estão hoje, digamos assim, em situação de limbo. Porque o Dnit arcou com custo, a prefeitura comprou. Mas não foi utilizado para a finalidade do convênio. Isso virou um imbróglio. De quem é o terreno? É meu ou é seu? A prefeitura não tem meios jurídicos para dizer que aquilo é dela e fazer uma reocupação da área”, explica o juiz federal Cláudio Pina, responsável pelo Programa Concilia.

A conciliação entre Dnit e PBH é observada de perto por Pina e pelo desembargador André Prado de Vasconcelos, que integra a Comissão Nacional de Soluções Fundiárias. Em entrevista ao EM, Vasconcelos projetou o que deve ocorrer com o terreno ocupado, exemplificando com o caso de uma urbanização ocorrida na Região Centro-Sul da cidade.

“Na Avenida Nossa Senhora do Carmo, na Vila do Bicão que desce até perto da Avenida Prudente de Moraes, houve mudança de tecido social. Você mantém a população onde ela está, constrói prédios, urbaniza, melhora a vida das pessoas. Isso provavelmente vai ser o que a prefeitura vai acabar fazendo nesse terreno do Bairro Belmonte. E também vai ser dado um outro terreno para a gente reassentar as famílias da 381, porque é prioritário viabilizar a duplicação da BR-381”, explicou o desembargador. 

LEIA AMANHÃ: Desafios para a PBH cumprir o prazo do TCU

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