Ao assistir pela televisão aos ataques de 8 de janeiro de 2023, a jornalista, escritora e crítica de arte Graça Ramos teve a ideia de fazer a coleção “Palácios da democracia”. Aos prantos, ela tentou explicar para o neto de 5 anos o porquê das lágrimas: “Estão destruindo meus palácios”.

O menino não entendeu, mas a avó sentia pelos prédios depredados o afeto de quem ama Brasília desde criancinha. Tem as joias idealizadas por Oscar Niemeyer como referência de patrimônio brasileiro.

“Quando veio o 8 de janeiro, pensei: temos de explicar para essas gerações que os palácios nos pertencem, são patrimônios de todos nós”, conta Graça. Um contato com Fernanda Pereira, da editora Quereres, especializada em literatura sobre o patrimônio, deu rumo ao projeto dela.

Três autores – Conceição Freitas, Tino Freitas e Otávio Júnior – e três ilustradores – Mano Wladimir, Kleber Sales e Bruna Assis Brasil – ficaram encarregados de contar a história do Palácio do Planalto, do Supremo Tribunal Federal e do Congresso Nacional.

As narrativas foram pensadas para crianças de 7 a 14 anos. “Durante dois anos, os autores e ilustradores trabalharam, pesquisaram imagens de referência e produziram os livros com patrocínio da Fundação Matias Machline, que atende alunos carentes no Norte do país”, explica Graça. “Era importante contar a história dos palácios em linguagem ficcional, todos eles têm uma aventura fictícia.”

Palácios e afeto

Os autores falam sobre o 8 de janeiro, mas isso não é o cerne dos livros. Os palácios são personagens também. “O cerne, mesmo, está em como foram construídos, a importância dos candangos, o que esses prédios simbolizam para nós como sociedade e como se aproximar deles”, diz Graça.

Vândalos destruíram salas do Supremo Tribunal Federal na manifestação antidemocracia de 8 de janeiro de 2023

Ed Alves/CB/D.A Press

Para a organizadora da coleção, os livros podem ajudar a despertar nas novas gerações o interesse afetivo pelos palácios, semeando sentimento capaz de impedir, no futuro, que destruam o patrimônio.

“Se não aproximarmos o patrimônio das novas gerações, não tem como elas amarem esses palácios como nós amamos”, afirma a escritora. Segundo ela, palácios são espaços simbólicos de cidadania na democracia – a intenção dos livros é explicar o que isso significa para a população de um país.

“No livro, a criança vê o que acontece ali dentro, o funcionamento, por que são importantes para a democracia e entende como a República estabelece a divisão equilibrada dos poderes”, explica a idealizadora da coleção brasiliense.

Juju, a menina de pedra

A cronista e jornalista Conceição Freitas conhece a história de Brasília como poucos. Nunca havia feito uma narrativa inteiramente dedicada às crianças até criar Juju, a filhinha da estátua da Justiça que paira sobre a Praça dos Três Poderes.

Juju guia o leitor pela história do Supremo Tribunal Federal (STF) em “Casa da Justiça”, que tem ilustrações de Mano Wladimir, filho da cantora Marisa Monte.

Mano Wladimir, filho da cantora Marisa Monte, assina as ilustrações do livro 'Casa da Justiça'

Instagram/reprodução

A personagem chega à praça na mesma caixa que trouxe a mãe. No diálogo com a figura materna, Juju vai descobrindo a função e a importância da Suprema Corte.

“Escrever para criança tem de ter ludicidade, fantasia, meio mistura de 'João e Maria' com 'Alice no país das maravilhas', um simbolismo infantil. A criança é a melhor parte de nós”, afirma Conceição.

Para compreender o significado do Congresso Nacional, Tino Freitas criou a menininha serelepe que gosta de investigar palavras inusitadas. Em “Cartão-postal”, ele faz homenagem a Conceição Freitas e sua Banca da 308, na qual vendia livros e produtos relacionados à história de Brasília.

Candangos

A história, ilustrada por Kleber Sales, aborda também a chegada dos candangos, bisavós da personagem que vieram de Pernambuco ajudar a construir o sonho de JK.

“A ideia era falar de alguém que se apaixonou pela cidade, que veio de fora e é parte da geração de mulheres fortes que fizeram o melhor para que as gerações futuras tivessem um Brasil melhor. Enxergo isso na Conceição e na personagem, também cito mulheres importantes que aram pelo Congresso Nacional. A ideia é que, depois de ler o livro, o jovem possa entrar no Congresso e se reconhecer nessa história”, explica Tino Freitas.

No livro, Kleber Sales, ilustrador do jornal Correio Braziliense, quis brincar com o fato de Brasília ser uma cidade desenhada, que saiu da prancheta. “Usei os desenhos do Lucio Costa como se eles pudessem se transformar em algo real”, explica.

No volume dedicado ao Palácio do Planalto, Otávio Júnior cria um jogo on-line com questões sobre Brasília. O fio narrativo de “Coração do poder” é conduzido pela personagem Ana, jogadora decidida a ganhar a partida.

“Os livros têm uma coincidência não programada: as protagonistas são meninas”, destaca a escritora Graça Ramos.

Quereres/reprodução


“PALÁCIOS DA DEMOCRACIA”

• Livros “Coração do poder”, “Casa da Justiça” e “Cartão-postal”.
• De Conceição Freitas, Tino Freitas e Otávio Júnior.
• Ilustrações de Mano Wladimir, Kleber Sales e Bruna Assis Brasil
• Editora Quereres
• Preço sugerido: R$ 60 cada
• Informações: www.editoraquereres.com

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